OPÇÃO DNIT - Fábio Nunes, Diretor de Infraestrutura Rodoviária do DNIT

Dotado de um grande senso estratégico – cuidadosamente refinado ao longo de uma trajetória ascendente dentro da instituição que escolheu para atuar – talhando com esmero uma carreira de intenso trabalho e aprimoramento de estudos - o engenheiro Fábio Pessoa Nunes, possui uma clareza inequívoca quanto à história em curso, de um “Novo DNIT”, que ele, indiscutivelmente, ao lado de seus colegas, ajudou a formar. Instituição arquétipo dos transportes, presença do estado e estado da arte. Com base na conversa que RodoVias&Infra teve com o gestor, pode-se inferir um pouco de cada uma dessas qualidades à autarquia, além de outras, como o leitor poderá concluir daqui em diante.

RodoVias&Infra: Sua trajetória no DNIT abrange períodos históricos e decisivos para o Departamento. Desde sua atuação como coordenador até a atual posição como diretor, como você avalia essa evolução e a dinâmica do órgão ao longo desse período?

Fábio Nunes: Minha trajetória n o DNIT começou entre 2006 e 2008, quando atuei como terceirizado. Posteriormente, trabalhei no mercado com reabilitação de pontes e consultoria, adquirindo experiência até retornar em 2009 por meio de concurso público. Desde então, passei pela Coordenação Geral de Construção, onde fui inicialmente coordenador de Obras e, mais tarde, coordenador Geral Substituto. Permaneci nessa função até 2015, quando fui nomeado coordenador Geral de Manutenção, cargo que ocupei até 2019. A partir daí, fui para a Diretoria de Planejamento e Pesquisa, onde atuei até 2020, quando fui convidado para a Direção Executiva, assumindo como coordenador Geral de Modernização e Gestão Estratégica. Em 2022, cheguei à antiga Secretaria de Transportes Terrestres e, na sequência, retornei ao DNIT para assumir a Direção de Infraestrutura Rodoviária, atendendo a um chamado do governo.

Desde que entrei no DNIT, é notória a evolução da instituição, tanto em termos de estrutura física quanto de procedimentos. Quando ingressei, não havia sequer um padrão de mobiliário, com muitos itens herdados do extinto DNER, além de uma frota insuficiente, equipamentos ultrapassados e processos ainda manuais. A quantidade de servidores também era menor do que a atual. Hoje, temos uma estrutura mais sofisticada, e o material humano também melhorou significativamente, com a realização de quatro concursos públicos, resultando na entrada de mais de 200 analistas de infraestrutura. Com mais pessoal e melhor estrutura, o DNIT passou por um processo de refinamento, inclusive nas contratações, nas quais sempre foi pioneiro. 

Com a publicação do RDCi, o DNIT foi uma das primeiras instituições a utilizar essa ferramenta para agilizar suas atividades. Nenhuma outra instituição usou essa nova lei com tanta frequência quanto o DNIT. Fomos pioneiros também na criação de uma matriz de riscos, atribuindo responsabilidades tanto ao Departamento quanto às empresas contratadas. Essa iniciativa, na qual atuei diretamente, foi reconhecida e premiada à época.

Com a promulgação da Lei 14.133/2021, o DNIT novamente se destacou ao ser uma das primeiras entidades a contratar uma consultoria pelo critério de técnica e preço. O próximo passo será evoluir para contratações baseadas na melhor técnica, algo ainda pouco explorado no governo federal. Outra inovação que devemos implementar em breve é o “diálogo competitivo”, previsto na nova legislação e inexistente na Lei 8.666. Esse modelo permite a descrição do objeto da contratação, que pode ser algo muito específico e tecnológico, para o qual não há referência de preço. O mercado, então, apresenta propostas com as melhores soluções e preços. Essa será uma licitação inovadora, possivelmente no segmento de monitoramento e recuperação de pontes, o que tornará o processo ainda mais avançado.

A Lei 8.666 era bastante limitada, baseando-se no critério de menor preço. Embora entendamos a importância da otimização dos recursos públicos, a experiência mostrou que, em certos tipos de contratação, o melhor preço nem sempre resulta na melhor solução. Um exemplo claro são os contratos de consultoria, que exigem alto nível técnico. Não faz sentido contratar o engenheiro mais barato, mas sim o melhor, pois ele produzirá o projeto mais qualificado, o que resultará em uma economia significativa na execução da obra. Às vezes, economizar no projeto, que representa uma pequena parcela do custo total, pode gerar gastos adicionais durante a execução. A Lei 14.133 abre espaço para que as contratações sejam feitas com base na melhor técnica, garantindo, assim, maior qualidade e eficiência.

Considerando o tema da modernização, como o DNIT tem adotado novas tecnologias e práticas avançadas, incluindo o BIM e as parcerias com o iRAP, para melhorar a gestão e a engenharia no setor?

Sem dúvida. Recentemente, em uma conversa com o Luiz Guilherme Melo, diretor de Planejamento e Pesquisa, destacamos como a DPP tem se mostrado extremamente inovadora e pioneira, rompendo paradigmas no mercado. Um exemplo claro é a implementação da metodologia internacional iRAP, que, por meio de uma classificação de risco por estrelas, avalia o grau de segurança das rodovias e identifica as contramedidas necessárias para aumentar essa segurança. Esse alinhamento com as melhores práticas globais é um avanço significativo para o DNIT, colocando-nos em sintonia com o que há de mais moderno no mundo em termos de segurança viária. Em relação ao BIM, como mencionado, ele é outro elemento essencial nesse processo de modernização. No DNIT, já contamos com um núcleo de estudos dedicado ao BIM há bastante tempo, o que nos permitiu estabelecer critérios mais rigorosos para os níveis de contratação nessa área. Vale ressaltar que o BIM não é apenas um software, mas uma metodologia completa que exige uma mudança cultural dentro da instituição. Essa transformação cultural, especialmente em um ambiente institucional, é sempre o maior desafio e demanda tempo.

Além disso, podemos citar outras metodologias desenvolvidas internamente. Por exemplo, o Índice de Condição de Manutenção (ICM), uma métrica proprietária do DNIT, é um instrumento objetivo que mede a qualidade da malha rodoviária. Desde a primeira campanha do ICM, em 2016, quando a avaliação era feita manualmente por equipes que percorriam os trechos com celulares, houve uma grande evolução. Atualmente, todo o processo é automatizado por meio de Inteligência Artificial. Utilizamos tecnologias de reconhecimento ótico de caracteres (OCR), desenvolvidas em parceria com o LabTrans da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em um projeto executado por meio de um Termo de Execução Descentralizada (TED). Essa tecnologia, similar àquela usada para a leitura de placas no Plano Nacional de Controle de Velocidade (PNCV), é aplicada na análise de padrões de imagem, tanto do pavimento quanto de outros elementos, com processamento digital posterior. Esse avanço trouxe maior precisão e confiabilidade às nossas avaliações.

Programas como o CREMA, PATOs, REVITALIZA e PROARTE têm elevado significativamente o Índice de Condição de Manutenção (ICM). Como essa evolução se consolidou ao longo do tempo?

Independentemente da gestão ou direção que o DNIT tenha, sem recursos suficientes, as opções de ação são limitadas. Durante a administração federal anterior, enfrentamos uma queda acentuada nos contratos de manutenção estruturada, como o CREMA e os contratos de restauração, que exigem um aporte orçamentário constante e significativo. Sem a disponibilidade de recursos necessários, devido a uma decisão de governo, houve períodos de hiato nas ações de manutenção. A solução encontrada para evitar que a malha rodoviária ficasse desprotegida foi aumentar o número de contratos de manutenção não estruturada, os chamados PATOs (Planos Anuais de Trabalho e Orçamento), que chegaram a representar mais de 95% da nossa carteira, comparado a 60% em épocas de maior disponibilidade de recursos.

Com a eleição do presidente Lula, no final de 2022, e a aprovação da PEC da Transição, fomos surpreendidos por um aporte de R$ 20 bilhões. Naquele momento, não tínhamos uma carteira de contratos de manutenção estruturada pronta, pois não havia qualquer indicação prévia de que esses recursos estariam disponíveis. Diante disso, utilizamos os PATOs, que, embora fossem serviços menores, já estavam estruturados para começar a melhorar a qualidade da malha.

Foi nesse contexto que identificamos a necessidade de retomar os programas de manutenção estruturada, como o CREMA, e decidimos criar um contrato intermediário, o Programa Revitaliza, que preenche as lacunas entre os contratos de manutenção não estruturada e os de restauração. O Revitaliza é um programa baseado em levantamentos técnicos e indicações precisas sobre as ações a serem executadas. Já iniciamos a licitação dos primeiros contratos, e nosso objetivo é reequilibrar a proporção de contratos estruturados até o final do governo, com a meta de ter mais da metade da malha rodoviária coberta por contratos de CREMA, Restauração ou Revitaliza até 2026.

Esse esforço já se reflete em números. Desde julho, conseguimos superar a série histórica do Índice de Condição de Manutenção (ICM). Em apenas um ano e meio, não só recuperamos o patrimônio rodoviário perdido, como também atingimos a melhor condição de malha desde o início das medições em 2016. Essa é uma grande conquista tanto para o Ministério dos Transportes quanto para o DNIT. A meta, estabelecida pelo ministro, é alcançar no mínimo 80% da malha rodoviária com condições consideradas boas, e atualmente já estamos em 74%, com a expectativa de atingir a meta até dezembro.

Com o foco crescente em obras urbanas e contornos rodoviários, parece haver um movimento em direção a um “DNIT Urbano”. Como essa nova abordagem tem impactado a segurança viária nas regiões mais adensadas?

Não há como evitar que a malha federal atravesse áreas urbanizadas, especialmente em capitais e grandes cidades no interior, como é o caso de Campina Grande. Nesse contexto, o papel do DNIT é estruturar obras que desviem o tráfego de longa distância dos perímetros urbanos, pois essa convergência traz grandes desafios do ponto de vista da segurança viária. Além disso, por questões operacionais, essa situação acaba exigindo uma atuação mais próxima da esfera municipal. Por isso, adotamos soluções como “Contornos”, “Variantes” e “Travessias”. No caso de Campina Grande até Farinha, estamos adequando um trecho da rodovia para melhorar a segurança, o conforto e a fluidez no tráfego intermunicipal. Outras obras semelhantes incluem a Travessia Urbana de Ijuí (RS), a Travessia de Petrolina (PE), a adequação urbana em Juazeiro (BA), e o desvio da BR-262 em Três Lagoas (MS), com a construção de um contorno, entre outras. É importante destacar que o foco do DNIT não é o tráfego urbano, mas o de longa distância. Portanto, essas obras de contornos e travessias, mais do que simples duplicações, são essenciais para garantir que o tráfego de longa distância não interfira nas áreas urbanas, melhorando tanto a segurança quanto a eficiência das rodovias.

Ao falar de segurança viária, é essencial mencionar o programa BR-Legal, um pioneirismo do DNIT, e sua continuidade com o BR-Legal 2. Como esse programa ganhou relevância institucional ao longo do tempo?

A implementação do BR-Legal foi algo natural dentro de uma das três áreas da Diretoria de Infraestrutura Rodoviária (DIR): Coordenação de Manutenção, Coordenação de Construção e Coordenação de Operação, esta última com foco específico na segurança do usuário. É nessa coordenação que estão inseridos o PNCV (Plano Nacional de Controle de Velocidade), o PNP (Plano Nacional de Pesagem) e o principal programa de sinalização, o BR-Legal, que transformou o padrão de rodovias federais.
Com o BR-Legal, passamos a investir significativamente em tecnologia voltada ao usuário, com padrões de sinalização muito mais exigentes, como a retrorrefletância de alta qualidade, entre outros avanços. Trata-se, sem dúvida, de um programa que salvou vidas. No entanto, assim como outros programas do DNIT, ele também depende de recursos. Durante períodos de restrição orçamentária, a segunda fase, o BRLegal 2, sofreu alguns atrasos. Contudo, a primeira fase nos trouxe importantes lições, especialmente em relação ao uso de materiais, ao entendimento das áreas onde as sinalizações foram instaladas, e à distribuição dos contratos.
Agora, estamos avançando com o BR-Legal 2, com dois editais que cobrem aproximadamente 40% da malha federal pavimentada. Planejamos lançar mais um
edital em 2024 e outro em 2025, com a meta de cobrir 90% da malha até o final do programa. A retomada está em andamento, e é perceptível, especialmente à noite, a diferença nas rodovias que já receberam os novos contratos, dada a maior visibilidade e comunicação entre a rodovia e o motorista.
Outro ponto importante é que, atualmente, as condições da malha são boas o suficiente para receber essa nova sinalização. Não faria sentido aplicar uma sinalização de alta qualidade sobre pavimentos em mau estado. Agora, com a melhoria do pavimento, estamos implementando uma sinalização à altura, dentro de um planejamento totalmente alinhado às diretrizes do Ministério dos Transportes e do ministro Renan.

Falando um pouco de construções, quais os grandes empreendimentos que atualmente estão diretamente sob a marca DNIT pelo país?

Embora sejamos grandes entusiastas da manutenção rodoviária, é inegável que o verdadeiro motor do crescimento do país está na implantação de novas infraestruturas, especialmente rodovias. A criação de novos corredores, sua ampliação e duplicação são fatores essenciais para movimentar a economia. Recentemente, passamos por um período de baixa de investimentos, durante o qual praticamente não conseguimos implantar ou duplicar rodovias. No entanto, houve uma retomada, não só de programas, mas também de obras, incluindo algumas emblemáticas que haviam sofrido paralisações ou estavam em ritmo lento e precisavam ser finalizadas.

Entre essas obras, destaca-se a retomada do corredor BR-101 Nordeste, um projeto amplamente divulgado nos governos anteriores e que estamos encarregados de concluir, duplicando-o desde o Rio Grande do Norte até a Bahia. Já recontratamos o trecho da BR-101/AL, e em breve será publicado o segundo lote da BR-101/BA. Até o fim de 2024, queremos ter todas as obras da BR-101 contratadas, e, aplicando os recursos como previsto, concluiremos o empreendimento até o final de 2026. Outras obras prioritárias incluem a duplicação dos trechos remanescentes da BR-116/RS, entre Porto Alegre e Pelotas, que será entregue até o fim do atual governo, além de projetos regionais como o trecho entre Cabedelo e Oitizeiro, na Paraíba, que é fundamental para a capital do estado.

Falando em expansão da malha, há também importantes obras de implantação que finalmente conseguimos contratar. Um exemplo é a BR-030, parte das nossas rodovias radiais, cujo objetivo é chegar ao litoral da Bahia. Havia mais de 250 km sem implantação ou pavimentação, mas conseguimos contratar os trechos da divisa de Goiás até Cocos, e de lá até Cariranha, quase na divisa com Minas Gerais, além do trecho de Ubaitaba até Maraú, entregando uma nova rota de escoamento. 

Além disso, há projetos de implantação, pavimentação e duplicação de segmentos da BR- 104, BR-110, e da BR-163/SC até a Ponte do Peperiguaçu, na divisa com o Rio Grande do Sul. Temos ainda obras estratégicas no Mato Grosso, como a BR- 242 e a BR-158, que enfrentam desafios ambientais, mas são fundamentais para o escoamento de soja. Um exemplo importante é a BR-080 em Goiás, onde estamos concluindo a Ponte de Luís Alves, sobre o Rio Araguaia, e, em seguida, faremos a conexão com a BR-158/MT, um ponto-chave para a exportação de grãos.

Essas obras refletem nossa preocupação com a logística, que é crucial para a competitividade do país. Não adianta termos recordes de produção se não houver infraestrutura adequada para escoar essa produção. Como nossa matriz de transportes é fortemente baseada no modal rodoviário, a atuação da nossa diretoria é essencial para garantir o fluxo de commodities, grãos e produtos congelados, especialmente no Sul do Brasil. Nosso objetivo final é assegurar que os produtos brasileiros cheguem aos mercados de maneira competitiva.

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