“MAGIA DE BARCOS ESTRANHOS, NA BARRA ESPERANDO ADENTRAR”
Fisgado do belíssimo hino santista – que sozinho encapsula uma aula de botânica e paisagismo urbanístico, sem disfarçar uma certa aura de mistério e aventura, de autoria dos irmãos Ernesto Zwarg e Antônio Bruno Zwarg – o título escolhido para o início desta reportagem, é também um aceno direto à atualidade (de fato, também à atemporalidade) do ponto de tangência maior do Brasil, com as nações do mundo.

Fluida, a conexão física global, via de duas mãos, é também vascular para diversas economias, dos mais diversos sotaques, a começar, pelas nossas próprias, se levada em conta somente a “Hinterlândia” do Porto de Santos, que compreende de forma imediata um estado do tamanho de um país e uma cidade-estado, além é claro de mais 4 gigantes entes federados: MS; MT; GO e MG. Contudo, para falar do tema aqui apontado, a Autoridade Portuária de Santos – APS, é necessário deixar a magia de lado. A não ser é claro, que se considere inteligência, eficiência, tecnologia e investimentos pesados, um movimento concretizado ao mero acaso, sem se levar em conta a robusta realidade que se apresenta sobre o tablado. Um feitiço, na verdade bastante simples, mas restrito aos poucos que ousam se disciplinar para efetuá-lo: fixar e buscar objetivos, com intransigência, obstinação e ímpeto determinado. Nas reflexões do filósofo pré-socrático Heráclito, pouco mais de 2500 anos atrás, o “Pai da Dialética” lançou aos ventos, sua, talvez mais conhecida máxima – ainda válida: “Nenhum homem pode banhar-se duas vezes no mesmo rio, pois na segunda vez o rio já não é o mesmo, nem tão pouco o homem!”. Pois, calcada no passar do tempo e no ritmo da natureza, tanto as águas quanto este intangível e inexorável elemento (inexistente segundo alguns, mas que nos consome, segundo outros), de fato, não permite a mesma experiência em momentos diferentes do ponteiro, nem dos riscos no calendário, ainda que as mesmas etapas e atividades sejam repetidas com exatidão. Esta realidade que não compactua com a nostalgia, engana as lembranças e corrói as memórias – por vezes distorcendo-as – é um tanto simples em sua validação. O próprio ritmo da vida se encarrega de alterar, de bocado em bocado, mesmo a mais prescrita e circunspecta rotina, por exemplo, em um itinerário diário. Um tijolo a mais em uma construção, um cão novo a vadiar na vizinhança, um jardim cujas flores desabrocham… e o que dizer então do que julgávamos conhecer? Nada mais irreconhecível do que uma rua, uma cidade, ou uma estrada depois de um hiato mais longo. Finalizada por aqui, a digressão, veio como um comparativo em que, por outra oportunidade, houve um encontro com Santos e seu porto. Pouco mais de 5 anos aí contados. E havia o rugir resfolegante de motores roucos. E havia a fumaça. E havia o tráfego pesado de caminhões alquebrados. Suas filas. E olhares meio desacorçoados, perdidos entre os buracos. Mas desta vez não foi como esperado. Onde havia caos, tudo estava bem ordenado. Havia ainda sim uma fumaça – mas que depois, fomos informados, é a de um vapor d´água que sai da chaminé, já filtrado. Filas, somente na hora do almoço, no buffet de frutos do mar, para irritação do apressado. A comparação poderia seguir em frente, puxando ainda muitos outros itens aqui e ali pescados. Mas voltando às águas do filósofo, com os pés no barco, e olhando as ondas azuis e suaves, foi necessário encarar o fato, de que nem o próprio canal por lá é o mesmo. Está de calado adequado. 15 metros à risca (por enquanto), garante o certificado.
ONTEM, HOJE E AMANHÃ. DESDE SEMPRE.
Rapidamente avaliando a história do Porto, é fácil perceber que Santos, do Brasil Colônia ao Brasil do século XXI, sempre foi um fruto de seu tempo. Inaugurado em 2 de fevereiro de 1892, porém com atividades muito mais antigas reportadas (com a atual localização estimada por volta de 1540 e registros documentados lá pelos anos 1560, de próprio punho, pelo fundador da Vila de Santos, Brás Cubas – não confundir com o personagem machadiano), este pedaço de Brasil (disputadíssimo já desde àquela época, muito por conta do assédio de “francêzes”, que municiavam e financiavam tribos locais contrárias ao colonialismo da coroa “portuguêza”), sempre constituiu um ponto mercante, de abastecimento (e de defesa territorial, uma vez que além de Santos, um extenso complexo de fortificações incluía ainda Praia Grande, São Vicente e Guarujá e Bertioga), decisivo. Porém, durante muito tempo, o porto foi refém do ritmo tecnológico de suas épocas: “Os antigos atracadouros eram verdadeiras pontes de madeira, chamadas de trapiches, que ligavam a terra firme aos navios ancorados”, segundo documento sobre a Companhia Docas de Santos – CDS, encontrado no Arquivo Nacional – AN, via Diretório Brasil de Arquivos – DIBRARQ). Já no livro “Itatinga, a Hidrelétrica e seu Legado”, a autora Ana Luisa Howard de Castilho, anota com precisão o cenário: “Tudo acontecia de acordo com os desígnios da natureza, e os navios conseguiam se aproximar 100 metros da costa e por lá permaneciam fundeados. Para o embarque e desembarque da tripulação e das mercadorias eram necessários trapiches, pontes e lanchas; e para transportar as mercadorias das lanchas até os armazéns existiam os estivadores, que transportavam toda a carga nas costas”, o que, de acordo com o registro, era a regra em portos “pré-capitalistas”, em um período desde meados do século XVI até a primeira concessão, nos fins do século XIX. Ainda de acordo com a autora, com a chegada da família real, em 1808, houve a famosa “abertura dos portos às nações amigas”, o que foi um catalisador para o primeiro esforço de “modernização” portuária no Brasil, sem lá muito efeito, é verdade. Voltando aos trapiches, “Eles começaram a ser demolidos por volta de 1892, com a organização do porto”, também de acordo com documento sobre a Companhia Docas de Santos – CDS, encontrado no AN, via DIBRARQ), por ocasião de concorrência governamental em 1888 da qual se sagrou vitoriosa a companhia Gaffrée & Guinle, o Porto era servido por um cais que tinha 260 m (106 metros menor que as dimensões atuais das maiores naves a operar no porto, como, por exemplo, o MSC Orion, com seus espantosos 366 m de comprimento e 51 metros de largura). Para efeito de comparação, atualmente as instalações têm 16 Km de cais. Somente em 2024, foram mais de 180 milhões de t de cargas operadas, registrando consistentemente, 5% de crescimento anual ao longo dos últimos 10 anos, o que significa efetivamente que, em uma década, o Porto dobrou a operação, consequentemente, fechando um decênio de sucessivos recordes de movimentação, exercendo liderança nacional em cargas conteinerizadas e grãos, como açúcar, soja e milho. É uma capacidade tal (altíssima, por sinal), que atende aos 27 estados da federação brasileira e ainda, mais 200 países que se utilizam das facilidades do Porto de Santos para suas rotas comerciais, em 53 terminais, 62 berços, e mais de 120 Km de ramais ferroviários internos, sendo indiretamente responsável por cerca de 50 mil empregos (sem contar avanços como a expansão da poligonal, de 7,8 milhões de m² para mais de 20 milhões de m², investimentos de R$ 22 bilhões com o advento do maior terminal de contêineres do hemisfério Sul, o TECON 10, a ampliação da profundidade do canal, que chegará a 17 metros, e um novo condomínio no Saboó, para armazenamento e movimentação – tudo isso, em curto prazo). Olhando toda esta história, fatos recentes e números, faz totalmente sentido, portanto, a afirmação do atual diretor-presidente da Autoridade Portuária de Santos – APS, Anderson Pomini, de que “Nós construímos em 400 anos – apenas 400 anos – o maior equipamento de infraestrutura do hemisfério Sul. Todos os portos do mundo têm 3, 4, 5 mil anos de operação. Então, a gente tem que se orgulhar dessa boa construção”, declaração esta, feita durante a entrevista exclusiva à RodoVias&Infra, cuja íntegra você acompanha nesta edição.
CONTEXTOS
Para entender melhor a trajetória do Porto de Santos, mais sob a ótica prevalecente até hoje – a de Portal Comercial do Brasil – primeiro é preciso entender, ao longo do tempo, as forças que atuaram sobre ele, para que ele, afinal, como uma crisálida, se desenvolvesse – com muito, muito esforço – até chegar à sua nova e exuberante conformação. Com o advento da construção da Calçada do Lorena, em 1792, “a expansão do açúcar no interior do estado de São Paulo, mostrou-se necessária à abertura de um caminho mais adequado para a chegada da produção ao Porto de Santos”, explica o mesmo artigo acerca da CDS no AN, sobre a primeira concessão de exploração do Porto, pela já mencionada Gaffrée & Guinle, que originou a Companhia, fundada em 1902. Um processo de modernização (que se falhou em 1808, pegou mesmo de forma metódica e de vez, no início do século XX), que culminou, entre outros avanços, na construção da Usina Hidrelétrica de Itatinga, tornando o porto autossuficiente em geração de energia elétrica, com a sua inauguração em 1910, um feito por si só, notável: “destinada a fornecer eletricidade para a Companhia Docas de Santos (…) construída a 31 km de distância, na Serra do Mar. A capacidade projetada poderia atingir até 60.000 cavalos de potência, energia essa suficiente para atender, em 1912, às necessidades do Porto e das cidades de Santos e Guarujá, além de fornecer eletricidade a outras localidades e cidades do estado de São Paulo” (AN, DIBRARQ). De fato, a primeira experiência de porto como figura institucional constituída, uma entidade, algo bem diverso do que ocorria até então, de acordo com Howard de Castilho: “o espaço, bem como o processo de embarque e desembarque não estavam ordenados como um único porto, e sim como uma série de trapiches com diferentes donos, o que complicava as operações alfandegárias. Cada etapa do trabalho também estava sob diferentes comandos, por exemplo: os trapiches contratavam um pessoal para trabalhar como estivadores; já o dono das carroças que transportavam a mercadoria não tinha controle sobre os barcos, que pertenciam a outros; também os armazéns tinham proprietários diferentes. Coordenar todas as pessoas envolvidas para embarcar ou desembarcar as mercadorias nos navios era muito complicado e caro. As empresas de importação e exportação tinham que negociar os preços com cada um dos serviços e com cada dono separadamente. Por causa do grande número de pessoas que tinham acesso às mercadorias, as perdas e os furtos eram bastante comuns, e não eram fáceis de serem identificados. O custo de todo esse processo era muito alto e isso acabou diminuindo o interesse do mercado internacional em negociar com o Porto de Santos”. Para reverter esta situação, a inspiração em operações mais modernas, tal como hoje (e mais do que nunca, como no exemplo mais recente, como integrante de uma missão, da qual se falará um pouco mais na sequência), partiu de um olhar para fora, com intuito de encontrar a si mesmo: em portos estrangeiros. “No exterior, os portos modernos do século 19 já funcionavam com apoio do cais, e os navios atracavam próximos a eles. Guindastes hidráulicos embarcavam e desembarcavam as mercadorias e os portos eram ligados por uma ferrovia que conectava os armazéns ao cais, o que diminuía o tempo de todo o processo. O complexo portuário capitalista estava completo, permitindo que o conjunto de atividades variadas e organizadas facilitasse e acelerasse o escoamento das mercadorias. Em razão do pouco interesse que despertavam as importações pelo Porto de Santos durante boa parte do século 19 e da crescente importância do café, a modernização passou a ser tema de preocupação para as autoridades brasileiras já no fim daquele século. O resultado foi a construção de um porto moderno em Santos, inspirado nos portos internacionais, cuja organização e racionalização do processo produtivo estava no método adotado para tornar veloz o movimento de mercadorias. Para que o porto funcionasse como uma indústria, era essencial monopolizar o controle do pessoal e de atividades que envolviam guindastes, armazéns, lanchas, locomotivas do sistema ferroviário, oficinas destinadas tanto à produção quanto à manutenção de equipamentos, abastecimento de energia elétrica e o que mais fosse necessário para o seu perfeito funcionamento. Essa era a forma de organização desejada pelos investidores e aceita pelo Estado”, apontou Howard de Castilho. Findo o prazo de 90 anos, a concessão da CDS, eventualmente chega ao fim nos anos 1980, com a devolução ao estado, da administração e do acervo à CODESP – Companhia Docas do Estado de São Paulo, que, embora apontada como empresa de economia mista, era, em termos práticos uma estatal à esta época. Em 1993, impulsionada pela maior abertura do mercado brasileiro aos produtos importados (impactando notadamente a indústria e a empresas automotivas nacionais) a CODESP passa a receber, por meio da Lei de Modernização de Portos (8630/93), empresas privadas para operação de cargas. Já em 2013, com a Nova Lei dos Portos (12.815/13) flexibilizou-se a instalação de Terminais de Uso Privado (TUPs) e planejamento e licitações de arrendamentos voltaram ao comando federal. Atribuições até então da CODESP. Finalmente em 2019, tem início a modificação que resulta na moderna Autoridade Portuária de Santos – APS, que hoje conhecemos e que, aproou em definitivo o porto de Santos no rumo das melhores práticas, da alta tecnologia, da eficiência e do seu merecido reconhecimento em nível mundial, como referência.

LATITUDE E LONGITUDE
Evidentemente que todo o merecido destaque e boa reputação hoje desfrutados pelo Porto de Santos, com sua Autoridade a pilotar, com mãos seguras seu timão, é um processo, iniciado há dois anos, com horizonte 2023/2027, a partir de um PE, Plano Estratégico, com 10 eixos, 15 objetivos estratégicos, indicadores, metas e resultados parciais e que, inclusive, foi atualizado no começo deste ano (houve algumas adições). Confira alguns numeros do Porto de Santos de 2024. Mas, talvez entre todos eles, o que primeiro chama atenção do visitante, é justamente o que delineia a determinação de uma nova relação entre as urbes (são 5 os municípios por ele abarcados) praiana e seu porto, convenientemente denominada “Porto-Cidades”, e que – a propósito – é um ponto de honra tão grande para a APS, que constitui um “neologismo por esta, que visa refletir a importância do Porto de Santos em todo o seu entorno regional, com impactos significativos em vários municípios”. Palavras presentes no documento atual do PE ao qual RV&I teve acesso. Um expediente que reverteu a percepção de que “o porto estava de costas para a cidade”, tornando-o um ente mais próximo e participativo no âmbito regional e que já vem contribuindo com antigas demandas da população, como a revitalização em curso no Parque do Valongo e mesmo projetos maiores e mais abrangentes, que levam em conta os impactos locais, valorizando temas como mobilidade e mesmo, patrimônio histórico cultural (aqui, entre outros pontos, vale ressaltar a inclusão de uma ciclovia no projeto do túnel, um meio de transporte amplamente utilizado em toda a Baixada Santista na rotina diária da população, e a reabertura do Museu do Porto de Santos, fechado durante a pandemia do coronavírus e reaberto em junho de 2023). Seguindo pelas diretrizes, vale destacar que o Porto de Santos também é aderente (entre outros) ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável de número 13, ensanduichado no PE original entre “Proteção de Recursos Naturais” e “Gestão Ambiental”: Mudanças Climáticas. Um rol de critérios que estabelece as formas de cumprir os compromissos firmados (pelo Brasil), com a Organização das Nações Unidas, como a descarbonização das operações (já em curso e solidamente introjetada no mindset cultural institucional da APS, como deixou bem claro o diretor de Operações, Beto Mendes, na conversa que teve com RodoVias&Infra – e que você pode conferir na seção “Direções Cardeais”, sobre as diretorias executivas da APS, nesta edição), além, é claro de dotar as instalações de elementos mais capazes do ponto de vista de resiliência de infraestrutura e prevenção de potenciais riscos.
NÓS VAMOS INVADIR SUA PRAIA (E MELHORAR ELA)
Em paralelo, o Porto de Santos, tem sido contemplado, também, por uma robusta agenda positiva, por parte de outras esferas, para além da federal, diretamente responsável pela Autoridade. É o caso de dois projetos de enorme magnitude e potencial estratégico, não apenas em termos de estado de São Paulo, mas sob a ótica de um Brasil mais incrementado logisticamente, justamente em seu maior hub. Projetos ambiciosos que atendem por nomes quase míticos: túnel Santos Guarujá e terceira pista da Imigrantes. O primeiro, constituído por um sonho centenário e que, após muita discussão, idas, vindas, promessas e bravatas, avança a passos largos para deixar o papiro e agregar-se em materialidade. Com edital lançado no primeiro trimestre de 2025, em ocasião em que se encontraram tanto o presidente Lula quanto o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, o túnel Santos-Guarujá marcou um momento significativo, de harmonização política. O dispositivo (subaquático, a 21 metros de profundidade e com cerca de 4 metros de folga para as quilhas mais arqueadas a passarem sobre ele) terá 870 metros de comprimento (1,5 Km no total, levando-se em conta os acessos), três pistas em cada sentido, ainda abrindo a possibilidade futura de implantação da linha do VLT, promete reduzir significativamente (de fato, absurdamente) os tempos de viagem entre as duas cidades que, dependendo do modal escolhido, pode chegar a mais de 50 minutos e, dependendo da situação, mais de 2h, será concluído em apenas um minuto e meio. Tamanhas são as dimensões envolvidas, sob qualquer ângulo, que mesmo espectros políticos bem distintos tiveram que se curvar diante do empreendimento e para, de fato, tirá-lo do papel. Durante o lançamento do edital, o presidente Lula, em tom conciliador, afirmou: “O que nós temos que ter consciência é que nós só temos um lado: é atender bem o povo de São Paulo e o povo do Brasil. Esse é o nosso lado. E esse é o nosso compromisso. (…) É fazer o túnel para melhorar a vida do povo de Santos, a vida do povo do Guarujá e a vida do povo que vai atravessar de um lado para o outro”, declarou, afirmando também que o governador do estado de São Paulo, “Está fazendo história nessas parcerias que nós estamos construindo”. Por sua vez, o governador Tarcísio Gomes de Freitas, ressaltou: “Presidente, eu quero agradecer ao senhor, porque desde o início a gente teve as conversas sobre o túnel. O senhor colocou esse túnel como prioridade (…) eu me lembro do que o senhor falou: não está na hora de ter disputa política, nós temos que atender o cidadão. E é o que nós estamos fazendo no dia de hoje, aqui, atendendo o cidadão. Tem que agradecer as equipes que fazem a gestão do PAC”, disse. Em outra ocasião, o governador registrou para a posteridade: “(O túnel Santos-Guarujá) não vai esperar mais 100 anos. Essa espera vai acabar agora (…) É algo transformador para a Baixada Santista”, sintetizou. Também presente à cerimônia de lançamento do edital, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin, ao lado do ministro dos Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, detalhou: “Fizemos o projeto executivo, o EIA-RIMA, o licenciamento ambiental, faltava a parceria do governo federal. E o presidente Lula traz hoje essa grande promoção para a gente finalmente ter o túnel”, justificando em seguida: “O Brasil, no ano passado, exportou US$ 333 bilhões. Um terço disso partiu daqui, do Porto de Santos. E se prepare, porque nós vamos ter neste ano safra recorde e grande parte dela vai sair aqui pelo Porto de Santos”. Gerando cerca de 9 mil empregos entre diretos e indiretos, a obra terá investimentos de R$ 6 bilhões, com R$ 5,13 bilhões aportados pela união à Autoridade Portuária de Santos, e, de acordo com informações do governo federal, vai “beneficiar 5 milhões de moradores da Baixada Santista e do Litoral Norte, além de mais de 4 milhões de turistas que visitam a região, tornando mais rápida a travessia. As estatísticas mostram que 78 mil passageiros atravessam o canal com a balsa e, sem essa conexão, 10 mil caminhões precisam fazer um percurso de 45 Km”. O túnel, por sinal, foi destaque em um roadshow do qual participou o ministro dos Portos e Aeroportos Silvio Costa Filho, que apresentou o projeto a possíveis investidores e possíveis parceiros tecnológicos em Portugal, na Holanda e na Dinamarca: “Estamos levando esse projeto (túnel Santos-Guarujá) para investidores internacionais e especialistas que conhecem e executam obras semelhantes na Europa. Nós queremos garantir segurança técnica para entregar esse empreendimento tão aguardado”, completando: “O mundo olha para o Brasil como uma janela de oportunidades. Temos projetos sólidos, com segurança jurídica e ambiente favorável para investimentos. Apresentar o túnel, aguardado há quase 100 anos, é motivo de orgulho Vai beneficiar São Paulo e todo o país”, resumiu o ministro, integrante da missão internacional da qual participaram ainda o governador Tarcísio de Freitas, o secretário nacional de Portos, Alex Ávila, e o presidente da APS, Anderson Pomini. De acordo com informações do Planalto, em Portugal, o projeto foi apresentado à companhia Mota-Engil, parceira da gigante chinesa CCCC (China Communications Construction Company), responsável por obras emblemáticas como os túneis da Baía de Dalian e de Hong Kong–Zhuhai Macau e na Holanda à Ballast Nedam e da TEC Tunnel, referências em túneis submersos neste país. Ainda, a comitiva foi à Dinamarca para realizar uma inspeção técnica às instalações do “Túnel Fehmarnbelt, que ligará a ilha dinamarquesa de Lolland à ilha alemã de Fehmarn. Com 18,1 km, será o maior túnel submerso do mundo. Segundo Costa Filho, “a infraestrutura servirá como modelo para o projeto brasileiro”. Cabe ressaltar que a missão apresentou ainda diversos outros projetos da carteira brasileira, com expectativa de que ela seja suficientemente atraente para atrair algo em torno de R$ 30 bilhões em investimentos europeus. Investimentos estes que, nunca é demais frisar, costumam somente ser firmados com parceiros de altíssimo padrão operacional, rígido regramento de controle, absolutamente responsáveis sob o prisma socioambiental e, por último, mas nem sequer por um segundo menos relevante, estritas políticas de integridade e governança corporativa.

NOVA IMIGRANTES
Já a terceira pista da Imigrantes, que vem para trazer mais alívio ao intenso fluxo entre a parte continental e o litoral industrializado e logístico da região de Santos, São Vicente e Cubatão, ecoa, também, em suas dimensões, o assombroso feito de engenharia que foi a realização da pista existente (um marco da engenharia nacional, até hoje ainda sem paralelos e que, de quebra, ainda foi eleita – subjetivamente, é claro – como uma das 5 mais impressionantes pistas do país, em votação interna na Central de Redação de RV&I). De acordo com o governador do estado de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas, “a terceira pista da Imigrantes, projetada com mais de 22 Km de extensão (sendo destes, 17 Km somente de túneis), vem pra melhorar e muito a vida de quem sobe e desce do litoral para a capital. Vamos ampliar em 25% a capacidade total da rodovia, sendo que para veículos pesados esse crescimento será de 145%, com impacto direto no escoamento da produção para o Porto de Santos e fortalecimento do turismo garantidos por uma engenharia sofisticada e à altura do cidadão paulista. Fluidez, eficiência, conforto, menos tempo na estrada”, detalhou o governador em múltiplas divulgações.
A VER NAVIOS
A visita técnica ao Porto de Santos, realizada por RodoVias&Infra, contou com a curadoria, detalhamento e explicações do assistente pleno e encarregado do Museu do Porto de Santos (iniciativa mantida pela APS), Jorge Valias. Sobre ondas calmas e uma brisa constante e moderada, a bordo de uma das potentes e confiáveis lanchas de apoio “Fabiana”, o porto e sua faina rotineira pareciam imperturbáveis, com suas imensas e imponentes cidades flutuantes pacificamente atracadas. Suas águas, um caldo em 3 tempos, passado, presente e futuro, permitindo à imaginação retroceder e avançar livremente como as peculiares catraias, típicas da região. Singelas e permanentes testemunhas de onde outrora deslizavam os charmosos vapores “Ita” da Companhia Nacional de Navegação Costeira, paquetes, batelões e até mesmo veleiros como o Jorge Valias, assistente Pleno e Encarregado do Museu do Porto de Santos, este que fo reaberto pela atual gestão da APS hoje em dia famoso veleiro Kestrel, que descansa pacificamente na orla de Santos. Ainda são elas que ocasionalmente dividem o canal com os fortuitos New Panamax (denominação criada para designar a classe de navios que explora as dimensões ampliadas, em 2016, do Canal do Panamá), demais gigantes do alto-mar, os operosos rebocadores (que quando não estão pondo suas centenas de cavalos à prova, conectam-se à moderna rede de fornecimento de energia elétrica Onshore Power Supply – OPS, que permitem um hiato entre operações absolutamente limpo e sem a queima de sequer uma gota de diesel, e os cruzeiros (que ganharão, por sinal, uma área exclusivamente a eles dedicada em futuro brevíssimo). Em termos de contemplação, vale a recomendação há quem tiver a oportunidade de realizar o bordejo pelo canal do porto: vença eventuais receios e faça-o. Falando um pouco da operação, Valias, diante de um graneleiro de saída para o mar aberto, comentou: “São 62 berços de atracação, o que se traduz, em uma média diária de 38 operações de entrada ou saída no porto. Toda essa movimentação é monitorada e gerenciada pelo Centro de Controle do Sistema de Gerenciamento das Informações de Tráfego de Embarcações, mas pode ser acompanhada, também em tempo real por aplicativo disponível para o pessoal da autoridade”, disse. Seguindo da altura da Fortaleza Santo Amaro, adentrando pelo canal às modernas operações (como a do colossal conglomerado chinês Cofco,– agrícola, de granéis sólidos vegetais – maior terminal da companhia fora da China e erguido com investimentos de R$ 2,84 bilhões, que incluíram a aquisição de locomotivas e vagões), passando por enormes “Porta Contêineres” e curiosos navios “Ro Ro” (Roll on, Roll off, para transporte de automotores, que, literalmente como o nome significa, entram e saem rodando da embarcação, que na prática, é como um estacionamento de shopping que se move), a conformação multitarefas do porto, fica ainda mais evidente. Desde o aroma açucarado dos terminais de açúcar (algo inusitado, especialmente em contraste ao spray molhado e salgado subindo pela proa da lancha), ao controlado e cirurgicamente preciso aceno de guindastes acomodando as “cargas projetadas” (ou Terminal de Cargas de Grandes Dimensões – TCDG, que cuida do que afinal, é indivisível). Claro, esta polivalência será ampliada com a consolidação do Parque Valongo, cuja segunda fase está para ter início, abrindo em definitivo as instalações para uma indústria além dos granéis e bens de consumo: a indústria do turismo, que certamente ganhará novo e possante impulso com as intervenções no antigo e pioneiro cais de peso, efetivamente transformando-se, como quer o presidente Pomini no “Porto Madero brasileiro”, em referência à pitoresca atração cultural, boêmia e gastronômica portenha. O reforço desta vocação, turística e de lazer, vem, definitivamente na entrega da primeira fase das obras do Aeroporto Civil Metropolitano de Guarujá, e com início das operações previstas para 2026, atendendo aeronaves de aviação regional como os turboélices ATR 72, também ficou perceptível à equipe de RodoVias&Infra no trajeto realizado, que se estendeu praticamente aos limites do porto, indo além e ao largo da longa ponte ferroviária (que possui um sistema de elevação da seção central, aumentando consideravelmente sua altura em relação à linha d´água, permitindo que embarcações de “calado aéreo” mais avantajado possam passar sob ela sem problemas), pouco à frente do Terminal de Regaseificação de São Paulo (TRSP) – uma instalação flutuante, montada sobre o navio Höegh Giant, atracado em águas internas há pouco mais de um ano. Ao fim da visita, já com os pés sobre o píer flutuante, à poucos metros da terra firme, um apelo é feito à reportagem, sendo recebido assim, de maneira até algo confusa: “Falem bem do porto de Santos”. Ora. Depois do exposto, falaríamos o contrário por quê?
